Como você se sentiria se logo após comprar uma passagem por
R$1.500,00 com o seu Macbook para passar as férias em Nova York descobrisse que
seu melhor amigo, que usa um pc convencional no trabalho, fez uma compra no
mesmo momento que você para a mesma cidade, mesmo período e na mesma companhia
aérea, pagando apenas R$1.000,00?
Seria possível usar diversas palavras para descrever o
sentimento gerado por esta situação, e muito provavelmente nenhuma delas seria
positiva, certo? Pois bem, você sabia que este modelo de fazer negócios já é usado
amplamente ao redor do mundo? Claro que se utilizando também de diversas outras
variáveis como geografia, informações demográficas e hábitos de compra, mas
fato é que o conceito de preços dinâmicos já está bem disseminado em diferentes
mercados, e é só mais um exemplo do uso dos dados para tratar cada pessoa de
uma forma customizada.
Atualmente as empresas conseguem se beneficiar de diferentes
formas do incontável volume de dados disponível ao redor do mundo,
principalmente quando relacionados à pessoas: onde e como vivem, quais são seus
costumes, o que gostam, quais são seus hábitos de compra, e por aí vai. As
tecnologias relacionadas à captação e interpretação de dados evoluíram
absurdamente ao longo dos últimos anos, principalmente na última década, e isso
permitiu às empresas tratarem seus clientes como pessoas únicas, o que na
teoria é fantástico, mas na prática pode gerar anomalias como a citada no
início deste texto.
Ao ler o livro O Poder
do Hábito de Charles Dunhigg, me
chamou muito a atenção o exemplo dado em relação à varejista americana Target.
A rede de lojas foi uma das pioneiras em utilizar informações dos clientes para
sugerir produtos relacionados aos seus hábitos de compra. Basicamente ela
cruzava os dados pessoais dos clientes com as compras que habitualmente faziam,
e isso os ajudou a traçar diversos perfis. Um deles identificado foi o de
mulheres grávidas (perfil este que é extremamente valorizado por qualquer
varejista como a Target), que tinham um padrão de compra muito similar quando
estavam para ter filhos, e assim a loja passou a atribuir que todas as pessoas
com padrão de compra semelhante, provavelmente se encaixavam no perfil. Foi
executada em certo momento uma ação direcionada a este público onde foram
enviados panfletos com produtos em promoção como carrinhos-de-bebê e fraldas
para suas casas. Na teoria era uma ótima ação, uma vez que estas clientes
poderiam adquirir com desconto estes produtos em um momento tão especial de
suas vidas, porém pouco depois a loja recebeu um depoimento de um pai que
descobriu através do recebimento destes panfletos em sua casa que sua filha adolescente
estava grávida, além de diversas outras mulheres terem o sentimento de invasão
de privacidade com esta ação. Na teoria era uma estratégia fabulosa, na
execução, um desastre.
Assim como este exemplo, diariamente ouvimos muitos outros
que infelizmente são em sua maioria negativos, e com a expansão digital, isso
se agrava ainda mais, uma vez que os dados são captados de forma muito mais simples
e rápida.
Fato é que junto à grande oportunidade vem um imenso
desafio, e ele se resume em descobrir um meio termo onde o cliente é atingido
com uma mensagem relevante (inclusive isso é um grande ganho a ele próprio, uma
vez que hoje o bombardeio de mensagens totalmente desalinhadas com seus
interesses e anseios vem de todos os lugares) ao mesmo tempo que as ações de
marketing e vendas não são invasivas ou desrespeitosas, seja isso evidenciado
pelo uso indiscriminado das informações ou por algo como alterações de preços
para situações semelhantes.
Como um profissional de marketing digital, já tive
conhecimento de casos negativos como os relatados até aqui, e outros de empresas
que se utilizaram de dados para entregar mensagens extremamente adequadas a uma
pessoa específica, evitando uma enxurrada de propagandas e anúncios que além de
inefetivos, são incomodos.
Particularmente, sou um grande defensor de tecnologias para
tratar pessoas de forma customizada, acho que os ganhos são extremamente
relevantes para ambos os lados, uma vez que a empresa gasta menos ao focar seus
esforços somente em um público qualificado à sua oferta, e o consumidor não é
incomodado com mensagens irrelevantes. Porém é crítico que as empresas tenham a
consciência do indivíduo, parando de pensar em seus clientes como pessoas distantes
e passem a enxergar pela perspectiva deles (até porque também são clientes para
outras empresas, e em muitas vezes a sua própria), pensando primeiramente no
que é relevante para ele ao mesmo tempo em que respeita sua privacidade acima
de tudo.
Estamos na era digital onde não há mais tempo para distrair e se distrair com o que não é relevante, mas que tudo seja feito com
prudência, de forma respeitosa e extremamente inteligente, assim todas as partes
saem ganhando.